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terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Servidores falecidos na tragédia de Santa Maria

O blog faz sua homenagem póstuma às vítimas do incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, no último dia 27/01/2013, em especial aos colegas servidores:

Luiz Eduardo Viegas Flores, Oficial Escrevente da Comarca de Três Passos;

Rosane Fernandes Rehemann, Oficiala Escrevente da 4ª Vara Criminal da Comarca de Santa Maria;

Sérgio Krauspenhar da Silva, Estagiário da 1ª Vara Cível Especializada em Fazenda Pública da Comarca de Santa Maria; e

Natana Pereira Canto, Telefonista da Comarca de Santa Maria.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

A nova lei de detração na sentença penal condenatória


Em novembro de 2011, o governo federal lançou o Programa Nacional de Apoio ao Sistema Prisional, com repasse de R$ 1,1 bilhão aos estados e ao Distrito Federal para zerar o déficit de vagas femininas em presídios e reduzir a quantidade de presos provisórios em delegacias [1].

Apresentado em 25 de novembro de 2011, o projeto de autoria do Poder Executivo teve tempo de tramitação recorde e, depois de aprovado nas duas Casas Legislativas, foi sancionada pela presidente da República a Lei 12.736, de 30 de novembro de 2012.

Dentre as medidas propostas, algumas tiveram caráter legislativo. Uma delas levou ao Congresso Nacional projeto de lei para alterar o Código de Processo Penal e estabelecer que o juiz, por ocasião da sentença penal condenatória, deverá ajustar o regime de cumprimento da pena privativa de liberdade ou de internação ao tempo de prisão provisória ou medida de segurança já cumprido pelo sentenciado.

Com o propósito de racionalizar o sistema de execução penal, fornecendo mecanismos eficazes ao reconhecimento célere de direitos e benefícios, e evitar o encarceramento desnecessário de pessoas cuja situação jurídica já lhes permite maior aproximação da liberdade, a nova legislação funcionará como mais um mecanismo de acesso à Justiça da população carcerária.

A detração consiste no cômputo da prisão provisória no tempo de cumprimento de pena ou de internação, no caso de medida de segurança, antes do início da execução e se fundamenta no princípio da equidade e na vedação ao bis in idem [2], a nova legislação autoriza o juiz do conhecimento a efetuar o desconto já na sentença penal condenatória e ajustar o regime inicial de cumprimento da pena, permitindo que o indivíduo — cujo direito somente seria reconhecido meses depois pelo juiz da execução penal quando já protocolada a guia de recolhimento - possa dele desfrutar imediatamente.

Significa dizer que a recente lei antecipa o reconhecimento de direito legalmente assegurado sem a necessidade de esperar a burocracia do sistema de justiça, porquanto do sentenciado será, forçosamente, descontado o tempo de prisão provisória ou de internação, reforçando a garantia fundamental de individualização da pena, presente no artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal.

A abreviação deste tempo tem especial impacto na realidade prisional brasileira, infelizmente marcada por todas as deficiências já rotineiramente conhecidas que se espraiam por quase todo país. Não se trata de ampliação de qualquer benefício, mas de viabilização do reconhecimento de direito que será concedido em momento posterior. A nova lei nada mais é do que mero catalisador do instrumental judiciário, guardando estreita relação com o Programa Nacional de Apoio ao Sistema Prisional do governo federal, que o originou, e servindo para correção de situações manifestamente injustas.

Imbuída do racional espírito facilitador do reconhecimento de direitos, a nova legislação, no entanto, vem recebendo idêntica interpretação restritiva a que se deu à Lei 12.403/2011, conhecida como Nova Lei das Cautelares. Aqui e ali, a intenção projetada pelo legislador de fornecimento de instrumentos e mecanismos para evitar o desnecessário encarceramento tem surtido efeito oposto, em razão de interpretações absolutamente equivocadas.

A nova Lei de Detração não reduz ou suprime competência do juiz da execução penal [3]. Tão somente tem o objetivo, como já dito, de permitir ao condenado a adequação do regime de cumprimento de pena ao tempo de prisão provisória ou internação já cumprido, evitando disfunção do sistema de execução penal, que somente autoriza a operação, por força do artigo 107 da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal), quando já houver sido expedida guia de recolhimento meses depois. A diferença é que, a partir de agora, a competência será concorrente.

Ademais, aos que compreendem a inovação como progressão de regime, lembramos que a natureza da prisão cautelar eventualmente decretada não se confunde com a da prisão em regime fechado, esta decorrente de sentença condenatória. Ao juiz do conhecimento não caberá a análise de requisitos subjetivos para eventual progressão porque não se trata de concessão de nenhum benefício, senão de ajuste do tempo de pena já cumprido e cujo desconto apenas será antecipado. Por exemplo, se o indivíduo estiver preso provisoriamente há um ano e for condenado a seis anos em regime semiaberto, bastará ao juiz descontar o tempo de pena já cumprido e estabelecer o regime inicial adequado, qual seja, cinco anos em regime aberto. Outro exemplo, se este mesmo indivíduo, no momento da sentença, já não mais estiver preso provisoriamente, mas já tiver cumprido idêntico período, não há questionamento sobre requisito subjetivo, cabendo ao juiz a mesma operação.

Evita-se, assim, que o sujeito, cuja condenação foi menos gravosa do que a prisão cautelar tenha que, por força do artigo 107 da LEP, se recolher ao regime semiaberto e, no mesmo dia, efetuar pedido de detração e, consequentemente, ajustar o regime.

A interpretação segundo a qual a nova lei fornece ao juiz do conhecimento competência para concessão do benefício de progressão de regime reflete a equivocada intenção de seus defensores de confundir prisão cautelar e pena e, bem assim, reforçar entendimento de que aquela caracteriza antecipação desta, o que, sabemos, viola o princípio constitucional da presunção de inocência.

A interpretação desejada pelo legislador é a de fornecer ao juiz mais um instrumento para racionalização do processo de execução penal e tornar céleres os mecanismos de obtenção e eficácia de direitos, cujo resultado dependerá, sem dúvida, da boa interpretação jurisprudencial, através da qual poderemos ofertar à população melhores condições de acesso à justiça e à própria cidadania.

[1] BRASIL. Presidência da República. Ministério da Justiça lança Programa Nacional de Apoio ao Sistema Prisional. Disponível em: http://www2.planalto.gov.br/imprensa/noticias-de-governo/ministerio-da-justica-lanca-programa-nacional-de-apoio-ao-sistema-prisional. Acesso em 08 jan 13.
[2] FRANCO, Alberto Silva, BELLOQUE, Juliana. Codigo Penal e sua interpretação. 8ª Ed. São Paulo: RT, 2007, p.277.
[3] V. SILVA, César Dario Mariano da. A nova disciplina da detração penal II. Disponível em: http://www.midia.apmp.com.br/arquivos/pdf/artigos/2012__nova_disciplina.pdf. Acesso 10 jan 2013.

Marivaldo Pereira é secretário de Assuntos Legislativos do Ministéro da Justiça. É também mestre em Direito Processual Civil.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 22 de janeiro de 2013

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Reflexos da Lei 12.736/12 na execução da pena

Leonildo Albrecht*


A aprovação da Lei nº 12.736, de 30 de novembro de 2012, que dá nova redação ao art. 387 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, para a detração ser considerada pelo juiz que proferir sentença condenatória, nos permite uma constatação: a lei veio a beneficiar a pessoa do condenado na execução da pena.

Senão vejamos:

O acrescentado § 2º ao artigo 387 do CPP estabelece que “o tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade.” (sublinhei).

Assim, o magistrado do processo de conhecimento, quando proferir sentença condenatória, ao fixar o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade deverá detrair o tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro.

Vamos a um exemplo prático: supondo que “A” fique preso preventivamente por 6(seis) meses e ao final do processo venha a ser condenado a 08 anos e 06 meses de reclusão. Pela regra antiga, como a pena aplicada é superior a 08 anos, iniciaria o cumprimento da reprimenda no regime fechado, ex vi do artigo 33, §2º, letra “a”, do Código Penal, sendo a detração objeto de análise e concessão somente na fase executiva. Pela regra atual, considerada a detração de seis meses na prolação da sentença, iniciará o cumprimento da pena reclusiva no regime semiaberto, conforme assim o dispõe o artigo 33, §2º, letra “b”, do Código Penal.

Qual a repercussão da Lei 12.736/12 na execução penal?

Peguemos o exemplo acima: até a vigência da antedita lei, o condenado a 08 anos e 06 meses de reclusão iniciaria o cumprimento da pena, como já referido, no regime fechado. Considerando a detração dos seis meses de prisão provisória, teria de cumprir 1/6 de 8 anos (01 ano e 04 meses) para progredir para o regime semiaberto e novo quantum fracionário, ou seja, mais 01 ano, 01 mês e 10 dias neste regime para atingir o regime aberto. Na prática, como requisito objetivo, deveria cumprir 02 anos, 05 meses e 10 dias de reclusão até obter o regime menos gravoso.

Pela nova lei, iniciará o cumprimento da pena no regime semiaberto e, salvo eventuais remições concedidas, terá de cumprir 01 ano e 04 meses de reclusão – 1/6 de 08 anos da pena já detraída – para obter o regime aberto. Computando-se os seis meses de prisão provisória, terá cumprido 01 ano e 10 meses de pena privativa de liberdade até atingir o regime aberto, isto é, 07 meses e 10 dias a menos do que pela redação anterior do artigo 387 do Código de Processo Penal.

Trata-se, pois, de lei mais benéfica ao condenado. Não vai nenhuma crítica a ela, até por que não é este o objetivo do blog, mas de uma constatação.

* Escrivão da 1ª Vara Criminal de Ijuí, cedido à Corregedoria-Geral da Justiça/TJRS